Monday, May 28, 2007

Reportagem sobre o MAN

Esta reportagem sobre o Movimento de Acção Nacional, da autoria do jornalista Paulo Costa, foi publicada no jornal Tal & Qual, edição de 6 de Janeiro de 1989.

ELES NÃO BRINCAM AOS FASCISTAS

Chamam-lhes fascistas, ou até mesmo nazis, só porque se saúdam entre si de braço ao alto, se proclamam antidemocráticos e se assumem como racistas; mas eles preferem dizer que hão-de ser uma alternativa face a um «sistema podre», identificam-se mais com o «espírito inicial» do 28 de Maio de 1926 («que derrubou a partidocracia vigente») e dão Primo de Rivera e Rolão Preto como referência.
Eles são jovens, começam a ser muitos, e formam o Movimento de Acção Nacional. O «T&Q» foi ver quem são e como pensam estes jovens nacionalistas portugueses

Eles chamam-se Luís Paulo Henriques, Nuno Oliveira, António Rodrigues, Germano Tralhão. Têm 26, 23, 19, trinta e poucos anos. São todos solteiros, bons rapazes e muito apegados à família, católicos ou sem credo religioso. Quase todos trabalham, e não dão mostras de abastança, mas antes sinais de vidas feitas com sacrifício.
Formam os corpos directivos do Movimento de Acção Nacional. Luís Paulo é o presidente. É em sua casa que a conversa com os jornalistas do «T&Q» tem lugar, num suburbano rés-do-chão no centro da Amadora. De um lado da sala, está uma cristaleira e dois guarda-loiças dos anos cinquenta e algumas cadeiras que já viram melhores dias; do outro lado, debaixo da bandeira negra com a cruz céltica bordada a branco e de alguns cartazes do movimento, frente a uma mesa de sala coberta de um simples pano creme, fala-se de «revolução» e de «conquista do poder».
Na melhor tradição das conferências de imprensa, é Luís Paulo que faz quase toda a conversa. Exprime-se melhor que muitos jovens políticos no poder e vê-se que tem leituras e bagagem cultural. Responde a todas as perguntas, está à vontade entre temas como racismo e violência, e referências a Hitler, a Nietzsche ou a Salazar.
O Movimento de Acção Nacional – explicou-nos ele – foi legalizado como associação por uma escritura pública efectuada na Amadora em Junho de 1985. Surgiram da reunião de vários grupos de jovens e eram menos de quarenta quando começaram. Hoje, são «largas centenas», preferem não especificar.
Estão organizados em termos de células e só não têm núcleos de activistas na Madeira e em três distritos do interior (Bragança, Vila Real e Guarda).
Dentro de dois ou três meses, esperam realizar o seu primeiro congresso. Ainda este ano querem abrir uma sede em Lisboa. Aliás tudo indica que serão dois locais, um reservado, como é evidente, não porque tenham medo, já que «tudo o que fazem é legal» e «quem não deve não teme», mas por em termos de locais públicos lhes ser «mais complicado trabalhar».
O Movimento de Acção Nacional – dizem-nos – é autofinanciado. Todo o dinheiro lhes vem das vendas de material, das quotizações, eventualmente de alguns donativos. Têm o «dinheiro necessário» para fazer o que se propuseram, mas não revelam orçamentos. Ninguém diz, e eles não serão os primeiros.
Têm também «ligações internacionais», formais e directas, com três movimentos congéneres: a Frente Nacional inglesa, o NPD alemão (mais com a juventude nacional democrata) e com o Partido Nacionalista Francês e Europeu, com o qual estão a preparar um folheto para ser lançado em França entre os emigrantes, de um lado é português…
O Movimento de Acção Nacional prepara «uma revolução». Está hoje a formar os homens - «os seus soldados políticos» - para construir «a alternativa nacionalista face ao sistema que hoje existe em Portugal». O seu objectivo final «é a conquista do Poder». Não é tarefa para um ou dois meses: «pode demorar dez anos ou mesmo vinte, o tempo que for preciso».
Eles já estão «a preparar tudo», porque entendem que «o que é preciso é alterar a situação e unir o povo».
Os partidos, consideram, «servem para dividir o povo, para conquistar parcelas de poder». Criticam por isso a «partidocracia» e assumem-se do lado de fora do leque partidário. Querem «organizar-se de uma maneira diferente» e «unir o povo, conquistar o Poder, não tomar uma parcela de Poder momentaneamente».
Não pretendem concorrer a eleições, nem sequer a eleições académicas. «Esta sociedade» - dizem - «está caduca e é preciso mudá-la». Querem por isso construir «uma nova sociedade, com um novo tipo de homem, que tem de ser educado para isso». É o que «estão a fazer agora a si próprios» e o que «vão fazer às outras pessoas».
«E seremos poder, quando o povo manifestar adesão popular às nossas ideias».
A adesão aos seus princípios de grandes alas juvenis já lhes «é evidente». Controlaram já algumas escolas, nomeadamente em Castelo Branco. E controlam hoje algumas associações de estudantes, «através de activistas nossos que são presidente de associações».
Entre as associações estudantis, acham aliás que «estão em todo o lado», mas não enveredam nunca por movimentos «eleitoralistas», nem assumem listas próprias.
«Também não é mentira que estejamos implantados em algumas claques de futebol dos clubes mais representativos. Temos elementos nossos que vão ao futebol e que se incluem nas claques, mas não é nada organizado, porque não tem de ser».
Depois, a pouco e pouco, hão-de pedir outras coisas ao povo. «Hoje, já há dois milhões de portugueses que não votam, mais trezentos ou quatrocentos mil que votam nulo ou em branco…»
A sua revolução, dizem-no e nisso parecem acreditar firmemente, «avançará como o vento».
Contra «um sistema igualitarista», contra «esta sociedade que não interessa, porque é violenta, porque é repressiva, porque nela abunda a droga, a delinquência e nada se faz para combater isso», eles, nacionalistas portugueses apresentam «toda uma outra visão da sociedade».
Não lhes interessa a representação parlamentar, o voto como forma de participação no Governo «como é que se pode dizer que um deputado por Bragança representa trinta mil pessoas se ele está aqui em Lisboa e muitas vezes nem sequer é de lá»
Pretendem, isso sim, «que o povo participe através das associações populares de base, dos sindicatos, das corporações, dos municípios, que esses sabem o que é preciso fazer e até dão bons exemplos, mesmo no sistema em que vivemos».
Em vez do sufrágio universal, «um Estado corporativo». Os partidos que existem – dizem – «têm tendência a ser reformistas». E eles, o que querem é «destruir o que está podre, o que está velho, e construir de novo».
«É preciso revolucionar» - proclamam. Ai está «o radicalismo nas ideias», e «é por isso que às vezes são conotados com a violência, ou a extrema-direita».
Assumem-se como «duros», como «radicais», como «rebeldes». Mas não se entendem nem como violentos, nem como extremistas.
Combatem A, B, C, mas sempre «através das ideias, da escrita e do diálogo», porque a sua «postura» é a de serem «cordiais» e traçarem «o seu próprio caminho».
A violência física «poderá ser uma situação em que sejam colocados», porque «o sistema dificilmente sairá sem reagir» e «nessa altura terão que se defender».
Agora não dizem que «vão planear golpes ou coisas desse género», porque não lhes interessam «acções putchistas do tipo Terrero Molina».
«É mais importante a força das ideias, e o combate positivo, organizado, através de todos os meios legais, do que resignar a acções violentas».
Também por isso, dizem «deplorar» incidentes como os ocorridos recentemente com alguns “cabeças-rapadas” que também integram o seu movimento.
Não são nem querem ser «uma milícia armada». «Ter armas era apenas dar razão àqueles que lhes querem arranjar problemas» declaram, e de momento «só vêem acção dentro das normas legais», mesmo que «não concordem com algumas».
Quanto aos que os apontam como de extrema-direita, dizem que «todas as ideias que têm a ver com as reais necessidades do povo nunca serão de esquerda nem de direita, mas, quando muito, nacionalistas».
Onde eles estão é «do lado de fora, no ponto de intercepção entre a extrema-esquerda e a extrema-direita». Isto nas palavras de José António Primo de Rivera…
É também por isso que não se identificam nem com Salazar nem com Hitler. Podem até admirá-los por algumas das suas políticas, mas tantos anos depois, o que dizem é que «não vale a pena recalcar o passado» e não querem «ressuscitar cadáveres».
«Até porque não queremos andar toda a vida com a cruz às costas, e sermos os fascistas, os maus, apenas porque temos outras ideias…»
Por isso, as suas preferências vão todas para as revoluções populares europeias dos últimos cinquenta anos.
Identificam-se ainda assim talvez mais com «o espírito revolucionário do 28 de Maio de 1926». Porque «foi uma revolução, e não apenas militar. Quem fez aquela revolução foi o povo, que estava farto da partidocracia, que estava farto que se queimassem igrejas, que se mudassem ministros e presidentes a torto e a direito e daquela cambada toda de maçons e judeus».
São assim os jovens nacionalistas portugueses. Saúdam-se de braço erguido, ao alto, à nazi, ou à romana, como eles preferem dizer, mas não o fazem para a fotografia, porque «não gostam de encenações».
O seu futuro próximo será para «consolidar a força do movimento». Para daqui a dez anos, sonham com «uma organização diferente, com outro poderio».
Depois, querem começar a «alterar o curso dos acontecimentos», através da «força das ideias, do movimento popular».
Com uma «elite política», uma «minoria organizada». Porque «a revolução será obra de uma minoria decidida e inacessível ao desencorajamento» …

CIGANOS OLÉ!

«Portugal para os portugueses» é um dos «slogans» do Movimento de Acção Nacional. Para atender a esta reivindicação, os jovens nacionalistas portugueses propõem por isso o repatriamento imediato de cabo-verdianos, indianos, angolanos, moçambicanos, etc., etc.
Não consideram no entanto que o conceito de raça que professam derive de alguma leitura apressada do «Mein Kampf»:
«O que nós dizemos é que cada continente tem determinadas características geográficas e culturais. Normalmente, cada continente tem também um determinado tipo de pessoas, mais escuras ou mais claras».
A Europa – defendem – «é um continente de brancos». E eles consideram-se europeus, «têm orgulho em ser brancos» e «é isso que querem preservar». Portanto, repetindo sempre que «não têm nada contra ninguém», o que dizem é que «as pessoas não se devem misturar. Se há um determinado tipo de pessoas, se há outro, o que não se pode permitir é que haja mesclagens, porque, ao misturar duas raças, elas deixam de existir, puras».
Não que, como brancos, «se achem superiores ou inferiores». Mas julgam-se no direito de «preservar» a sua raça, a sua cultura e as suas tradições. Assumem-se como «diferentes».
Por causa disso, não condenam «as relações de amizade», não condenamos «que brancos e negros vivam em comunidade» (o que aliás consideram «extremamente difícil, porque toda a gente sabe dos conflitos que há em África, entre as próprias tribos de negros, e os conflitos que há nas sociedades multiraciais»).
Daí que entendam que «deve haver um repatriamento massivo para determinados países de origem».
«Portugal não pode continuar a suportar refugiados angolanos, moçambicanos e não sei quê, e pagar-lhes ali as despesinhas todas» - dizem. Citam Rodrigo Emílio, um dos seus teóricos preferidos: «Dantes havia um sonho, que se tornou impossível. Eles quiseram que fosse assim. Então, Portugal neste momento não tem que ter responsabilidades nenhumas».
«Hoje, nós estamos aqui e é esta a nossa terra. A nova geração de portugueses não tem sequer que pagar pelos traidores que fizeram a descolonização».
Consideram também o «problema demográfico», e dizem por isso não poder concordar que «uma família de portugueses tenha um ou dois filhos, como hoje já é normal, e uma família de negros ou de indianos que viva nas barracas tenha sete, oito, nove ou dez, quando não há condições para isso».
«Há que criar certas e determinadas limitações» - concluem. Não que a eles os mova «nada contra as pessoas, contra aquilo que eles são, os cabo-verdianos, por exemplo». Pelo contrário, eles «até os querem preservar». Para isso, até citam uma organização negra americana que diz que «os negros devem voltar para África, e não se devem misturar…»
Talvez por isso, a única «raça estranha» que os nacionalistas portugueses dizem respeitar, senão admirar mesmo, de certa maneira, é a dos ciganos: «Um povo nómada, que mantém a sua cultura e a sua tradição, e que normalmente não se mistura com quem não seja do seu meio».

POLÍTICOS

Os jovens nacionalistas portugueses têm pontos de vista muito próprios acerca das figuras políticas e da própria situação política portuguesa, tanto do passado como do presente.
Em resumo, é isto o que eles, pela voz dos seus dirigentes, pensam de:
CAVACO SILVA - «Tenta ser relativamente populista, quer dar aquela imagem, por isso tem tempos de antena todos os dias nos “Telejornais”, às vezes até em situações caricatas (no outro dia, esteve a dar cinco minutos de notícias no “24 horas”, a falar do Panamá e da América do Sul, sempre com a fotografia dele). Pronto, chegou lá, prometeu muito, não fez nada, é só mais um homem com um elo emprego».
MÁRIO SOARES - «É uma pessoa que pouco ou nada tem a ver com a realidade, ligado à Maçonaria quando 95% dos portugueses são católicos. Antes do 25 de Abril, teve um passado político de combate, mas consta que teve também umas atitudes desonestas em relação a certos símbolos nacionais».
«De resto é uma pessoa que sabe dar os seus belos golpes de rins, aliás provou-o. No actual sistema acaba por ser apenas um boneco, representa, mas não sabe bem o que representa. Além disso, deve ser o português que mais viaja».
«Às vezes, oferece-se aí umas medalhas a título póstumo. Quanto a Mário Soares, um dia, talvez não seja já no seu tempo, se Deus quiser há-de fazer-se o julgamento dele, e de outros homens que fizeram actos como a descolonização, para responder por todos os crimes, pelo milhão de mortos de Timor, pela descolonização exemplar, pelo terrorismo que existe em Portugal».
ÁLVARO CUNHAL - «Está a caminhar para o lado contrário e assim irá continuar toda a vida, há-de morrer agarrado aquilo». Mas «eventualmente saberá o que quer, tem os seus princípios» e, embora «lhes repugne», respeitam-no por isso, «porque de certa maneira tem tido até uma postura mais recta do que outras pessoas».
PSD - «É mais um partido como os outros, um bocado do sistema mesmo, uma máquina que dá de comer a muita gente e paga bons ordenados».
CDS - «É aquela direita conservadora que parou no tempo. Marca passo, e está ali e já não vai para lado nenhum, como está mais que provado».
PS - «É aquele partido que foi feito para ser poder e não o é. Por isso tem montes de pessoas lá dentro que não sabem o que hão-de fazer, e que entretanto ajudam a destruir o seu próprio partido. De resto, é apenas mais um partido de esquerda».
PC - «É um fóssil vivo. Continua a ser o que era há cinquenta anos e está a envelhecer. Tem uma grande máquina, sim senhor, mas é um partido caduco e está a perder toda a influência que tinha».
A DIREITA PORTUGUESA - «Politicamente não existe, porque ou alinha com a esquerda, e tem por exemplo uma política externa de esquerda, ou tem medo. Sobretudo, além de conservadora, é extremamente passiva. Limita-se a não fazer nada, não ser nada e entrar no joguete dos outros. O que é que representa aquilo que seja passivo, quieto, que não faça durante não sei quanto tempo, à parte umas situações corruptas que por ai vão havendo?»
SALAZAR - «É uma pessoa que na história contemporânea portuguesa tem realmente a sua importância. Foi um grande estadista, cometeu erros como toda a gente, mas foi de longe muito mais eficaz durante anos que toda esta cambada».