Sunday, November 18, 2007

A esquerda de outros tempos

A título de curiosidade, aqui fica a lista dos inúmeros partidos políticos de esquerda que surgiram com o 25 de Abril de 1974, e que com o passar dos anos ou foram extintos ou se fundiram com outros partidos. Alguns destes partidos não se extinguiram totalmente, passando a funcionar como associações políticas.

Movimento Democrático Português/Comissões Democráticas Eleitorais (MDP/CDE) - fundado em 1969

Partido Comunista de Portugal (Marxista-Leninista) (PCP-ML) - fundado em 1970

Liga Comunista Internacionalista (LCI) - fundada em 1973

União Democrática Popular (UDP) - fundada em 1974

Movimento de Esquerda Socialista (MES) - fundado em 1974

Aliança Operária Camponesa (AOC) fundada em 1974

Partido de Unidade Popular (PUP) - fundado em 1974

Frente Socialista Popular (FSP) - fundada em 1974

Frente Eleitoral Comunista - Marxista-Leninista (FEC-ML) - fundada em 1975

Partido Revolucionário dos Trabalhadores (PRT) - fundado em 1975

Grupos Dinamizadores de Unidade Popular (GDUPs) - fundado em 1976

Organização Comunista Marxista Leninista Portuguesa (OCMLP) - fundada em 1976

Partido Socialista Revolucionário (PSR) - fundado em 1978

União de Esquerda Socialista Democrática (UEDS) - fundada em 1978

Partido Trabalhista (PT) - fundado em 1979

Força de Unidade Popular (FUP) - fundada em 1980

Partido Socialista dos Trabalhadores (PST) - fundado em 1980

Partido Comunista Reconstruido (PCR) - fundado em 1981

Liga Socialista dos Trabalhadores (LST) - fundada em 1983

Frente de Esquerda Revolucionária (FER) - fundada em 1989

Política XXI (PXXI) - fundada em 1994

Fonte: http://www.cne.pt/

Wednesday, July 4, 2007

Partido Nacional Renovador - Breve resenha histórica

No final do ano de 1999 um grupo de simpatizantes da extrema-direita adere ao moribundo Partido Renovador Democrático (PRD) com o intuito de organizar um partido de cariz nacionalista, algo inexistente na época em Portugal. A estratégia consistia na apropriação dum partido já existente e registado no Tribunal Constitucional, na alteração do nome, sigla e símbolo, na subida aos orgãos directivos do partido em questão de membros do grupo, e desta forma nascia no panorama político português um partido nacionalista, algo até aqui inédito, em grande parte devido à dificuldade que os militantes da direita radical tinham sentido em anteriores tentativas na angariação das 5.000 assinaturas necessárias para a formalização dum partido político. A 17 de Março de 2000 entra no Tribunal Constitucional um requerimento por parte do PRD da alteração do seu nome, sigla e símbolo, passando a designar-se por Partido Nacional Renovador, com a sigla PNR, sendo o seu símbolo um facho de cores vermelha, branca e azul. O requerimento era assinado pelo presidente da Comissão Directiva do partido, António da Cruz Rodrigues – que anteriormente tinha formado a Aliança Nacional, organização nacionalista fundada em 1995 que nunca chegou a constituir-se como partido político precisamente por não ter conseguido reunir as 5.000 assinaturas necessárias para esse efeito – e por outros membros da direcção como José David Santos Araújo (presidente da Mesa do Conselho Nacional), Bruno Oliveira Santos (vogal da Comissão Directiva), Eugénio Manuel Campos Godinho e Francisco José Felgueiras Barreto (ambos secretários da Mesa do Conselho Nacional). A 12 de Abril o Tribunal Constitucional aprova o requerimento, e desta forma estava criado o PNR. A controvérsia à volta do PNR começou logo nos primeiros tempos do partido. A 28 de Maio de 2001 o presidente Cruz Rodrigues, por ocasião dum jantar comemorativo do 75º aniversário do golpe de Estado ocorrido em 1926 que impôs a ditadura militar em Portugal, anuncia a intenção do PNR em concorrer às próximas eleições autárquicas marcadas para 16 de Dezembro deste ano. O anúncio provocou a reacção do Bloco de Esquerda (BE), que classificou de “candidaturas fascistas” as intenções do PNR, e apelaram ao Tribunal Constitucional que impedisse a formalização das mesmas. No entanto, o partido avançou com candidaturas nos concelhos de Lisboa e Mafra, acabando por recolher 877 votos, 0,02 % da totalidade dos votos respeitantes ao Distrito de Lisboa, naquela que foi a primeira participação eleitoral do partido. Em virtude do descalabro eleitoral do Partido Socialista (PS) nestas eleições, o Primeiro-Ministro António Guterres apresenta a sua demissão, provocando a queda do governo socialista. O Presidente da República Jorge Sampaio marca novas eleições legislativas para 17 de Março de 2002, às quais o PNR também concorre, recolhendo 4712 votos, 0,09% do total. Durante a campanha eleitoral desta eleição deu-se um acontecimento, marginal à actividade do PNR, que apontou para o ressurgimento dos “skinheads” em Portugal: a 9 de Março um grupo de militantes do BE que se encontrava a colar cartazes na zona de Alcântara, em Lisboa, é atacado por um bando de “skinheads”, acabando por ser esfaqueado um dos militantes bloquistas. O partido só volta a demonstrar sinal de actividade em 2004 com um novo acto eleitoral, as eleições para o Parlamento Europeu realizadas a 13 de Junho, onde obteve 8405 votos, 0,25 % do total nacional, sendo de realçar que obteve o dobro dos votos obtidos nas eleições legislativas de 2002. Contudo, os “skinheads”, que até aqui se tinham mantido numa posição marginal, começam a partir de 2004 a demonstrar sinais de vitalidade e dinamismo, nomeadamente através da organização dum concerto em Loures que contou com presenças internacionais, ao mesmo tempo que se apropriavam da “internet” como meio de difusão de ideais, sendo merecedor de especial destaque o fórum nacional, onde chegou a estar publicada uma lista de “alvos a abater” pelos nacionalistas radicais. Este recrudescimento das actividades dos "skinheads" acabou por ter repercussões no PNR, que passou a contar com um corpo de militantes mais aguerridos e dispostos a fazer também das ruas um espaço de luta política. Desta forma no início de 2005 é organizada em Lisboa uma manifestação contra a entrada da Turquia na União Europeia, encabeçada pela organização Frente Nacional (FN) – onde se inseriam a maior parte dos "skinheads" nacionalistas – e acompanhada pelo PNR. No entanto, a 10 de Junho, precisamente no Dia de Portugal, dá-se um acontecimento que provocou um enorme impacto na opinião pública, em grande parte devido à cobertura mediática: o “arrastão” de Carcavelos. Um grupo de jovens de ascendência africana provoca alguns tumultos na praia de Carcavelos, o que leva a polícia a intervir. A comunicação social chamada ao local fala dum enorme “arrastão” de cerca de 500 jovens negros que provocaram o pânico junto dos banhistas. Ainda neste dia, uma organização nacionalista intitulada Causa Identitária comemora o Dia de Portugal no Largo de Camões, em Lisboa, o que levou um grupo de anarquistas a tentarem atacar os cerca de 50 nacionalistas que se concentravam junto à estátua do poeta Luís de Camões, o que não se concretizou devido à intervenção da PSP. No entanto, a polémica em torno da criminalidade associada às comunidades imigrantes estava lançada, o PNR aproveitou a situação e organizou, juntamente com a FN, aquela que foi considerada como a maior manifestação xenófoba de sempre em Portugal. A 18 de Junho cerca de 300 pessoas juntam-se no Martim Moniz, em Lisboa, e desfilam até ao Rossio, empunhando faixas onde se podiam ler mensagens como "Não existem direitos iguais quando és um alvo por seres branco" e "Imigrantes igual a crime". Pouco tempo depois, a 17 de Setembro, é levada a cabo nova manifestação na capital, desta vez contra o “lobby gay”, sendo novamente organizada em conjunto pelo PNR e pela FN, acabando por reunir cerca de 100 manifestantes, que se concentraram no Parque Eduardo VII. A toda esta dinâmica demonstrada pelo PNR, em grande parte potenciada pela FN, não é alheia a eleição em Junho de 2005 para a presidência do partido de José Pinto Coelho, que nunca negou o apoio dos “skinheads”, apesar da conotação violenta e racista que estes têm.

Tuesday, June 12, 2007

Revisão do artigo relativo ao Movimento de Acção Nacional

Em Junho de 1985 um grupo de jovens residentes na zona da Amadora regista no cartório a Associação Cultural Acção Nacional. Este colectivo tinha como missão a defesa dos valores nacionais, étnicos, culturais, éticos e espirituais, e as formas de concretizar estes objectivos passavam pela edição de um jornal e de livros. Eram estes os objectivos primários da Associação Cultural Acção Nacional. Os seus fundadores foram Vítor Santos, Manuel Andrade, Alexandre Freire, Paulo Sequeira e José Luís Paulo Henriques, que rapidamente se veio a tornar no líder do grupo, cabendo-lhe também a ideia original de fundar a associação. Este grupo de jovens tinha em comum o facto de pertencerem à classe-média baixa, estarem descontentes com o sistema político vigente na época, que consideravam corrupto, e de simpatizarem com ideais conservadores e nacionalistas. O tempo foi passando, e as posições no seio da associação foram-se consolidando, passando José Luís Paulo Henriques a liderar o colectivo, ao mesmo tempo que alguns dos seus fundadores se iam afastando das suas actividades. Este último, também conhecido por “Zé Gato” (alcunha ganha pelas semelhanças futebolísticas que tinha com o antigo guarda-redes benfiquista), não era propriamente um novato em matéria de actividade política, aos 16 anos já liderava a associação de estudantes do Liceu da Amadora e em 1983 já se encontrava à frente da secção que a Juventude Centrista (JC), a organizaçao juvenil do CDS, tinha nesta cidade dos arredores de Lisboa. No entanto, a militância na democracia-cristã não terá sido suficiente para José Luís Paulo Henriques, que se caracterizava por um aguerrido anti-comunismo e por um saudosismo do Estado Novo salazarista, o que o levou a abandonar a presidência da JC da Amadora. Entretanto, a associação passa a designar-se por Movimento de Acção Nacional (MAN), e começa a dar os primeiros sinais de dinamismo. Em 1986 é editado o primeiro orgão de informação do MAN, o jornal Acção, alguns cartazes começam a surgir nas paredes da zona, e os pedidos de adesão e informação começam a chegar em catadupa à sede do movimento, também situada na Amadora. Naquele que foi o seu primeiro jornal podia-se ler que o MAN caracteriza-se por uma Terceira Atitude, que se coloca em oposição ao Capitalismo e Socialismo, sendo o seu lema, explicíto nos cartazes que povoavam as paredes, Nem Capitalismo! Nem Comunismo! Terceira Via! Por Portugal!. Esta atitude de inconformismo e de rebeldia em relação ao sistema político vigente, de recusa do Comunismo que tanta agitação tinha provocado uma década antes, que provocou os saneamentos, as nacionalizações e a ocupação de terras, sendo tudo isto materializado no PREC; de desilusão em relação à Democracia Cristã defendida pelo CDS, que se encontrava numa posição cada vez mais redutora em virtude da ascenção do PSD liderado por Cavaco Silva, que por seu lado representava o Capitalismo, destruidor da identidade nacional e adverso às tradições seculares; levou a que muitos jovens aderissem ao MAN, que se apresentava como uma alternativa revolucionária (1). E terá sido esta sugestão de militância política mais agressiva que levou um grupo de jovens, por volta de 1987, oriundos da zona de Almada e que tinham em comum o gosto pela cultura “skinhead” (surgida em Inglaterra no final dos anos 60 no seio dos bairros operários, adepta da diversão regada com muito álcool e de alguma violência à mistura, por oposição ao “peace and love” da cultura “hippie”, e caracterizada por um vestuário e gostos musicais comuns) a aderir ao movimento. Este grupo de “skinheads” da Margem Sul era liderado por Fernando Pimenta, e começam a incutir um novo espírito no MAN, que passa a adoptar a cruz celta como símbolo, e que se materializa na edição do Combate Branco, publicação dirigida aos militantes mais radicais. A influência do movimento chega ao Norte do país, onde começam a surgir os primeiros militantes, nomeadamente no Porto e em Braga, e onde surge a primeira publicação, intitulada Vento do Norte. Mas ao mesmo tempo que o MAN aumentava a sua influência, também os problemas começavam a surgir em quantidade razoável. A adesão dos “skinheads” veio-se a tornar fatal para o movimento, que começou a ser visto pela sociedade portuguesa como um grupo de “cabeças-rapadas” racistas e violentos. A comunicação social começa a reportar alguns episódios de turbulência na noite lisboeta, nomeadamente no Bairro Alto (2), confrontos com outros grupos de jovens e agressões a indivíduos de origem africana começam a ser habituais, começam a surgir os primeiros símbolos de extrema-direita nos estádios de futebol, frases como Se vires um preto mata-o, Poder Branco ou Portugal aos Portugueses começam a aparecer escritas nas paredes de Lisboa, até que chegamos a 1989, ano que se vem a revelar decisivo na história do MAN, e onde se produzem alguns episódios marcantes, não só pela violência que envolveram, mas também pelo impacto que tiveram. Em Maio deste ano o actor João Grosso é agredido por um grupo de sete “skinheads” em Lisboa, tendo perdido um testículo em resultado das agressões, sendo de referir que João Grosso foi agredido por tentar socorrer um jovem que estava a ser espancado pelo mesmo grupo, e a 28 de Outubro José Carvalho, militante do Partido Socialista Revolucionário, um pequeno partido de orientação trotskista, é esfaqueado mesmo à porta da sede do PSR, na Rua da Palma em Lisboa, vindo a falecer. Tudo terá acontecido quando um grupo de “skinheads” oriundo da Margem Sul forçou a entrada na sede do partido, onde estava a decorrer um concerto inserido numa campanha anti-militarista promovida pelo PSR, os militantes trotskistas tentaram impedir a entrada do grupo, e no meio da confusão e das agressões José Carvalho cai no chão vítima dum golpe fatal na zona do coração. A Polícia Judiciária faz algumas detenções, enquanto que algumas vozes defendem que o crime teve motivações políticas. Pouco tempo depois do assassinato de José Carvalho, a 19 de Novembro, no Porto, um grupo de “skinheads” agride dois cidadãos espanhóis no centro comercial Brasília e espanca Francisco Faustino, indivíduo de nacionalidade angolana, sendo abandonado pelo mesmo grupo, inconsciente, na linha férrea. O MAN começa a ficar com a marca das agressões dos “skins” (3). Já a terminar este ano, talvez o mais atribulado da história do movimento, realiza-se um jantar no Porto a 1 de Dezembro, com o objectivo de aproximar a estrutura dirigente do movimento, que estava estabelecida em Lisboa, dos militantes nortenhos. No entanto, o repasto acaba em confrontos entre os dois grupos, o que simbolizava, de certa forma, a fragilidade e as contradições das bases militantes do MAN (4).

1 – Cf. Jornal Semanário, edição de 18 de Setembro de 1993;

2 – Cf. Jornal Tal & Qual, edição de 21 de Julho de 1989;

3 – Cf. A Extrema-Direita em Portugal, ed. SOS Racismo, 1998;

4 – Cf. VEGAR, José – “Áreas Especialmente Sensíveis” in Serviços Secretos Portugueses – História e Poder da espionagem nacional, ed. A Esfera dos Livros, 2007.

O surgimento da imprensa desportiva em Portugal

Com o advento do fenómeno desportivo em Portugal, alguns dos seus integrantes começaram a sentir necessidade de divulgarem as suas modalidades de eleição e as actividades dos clubes que integravam. E desta forma começaram a surgir jornais que funcionavam como orgão oficiais de determinados clubes. O primeiro a surgir foi O Velocipedista, jornal oficial do Club Velocipedista do Porto, de periodicidade quinzenal e cujo primeiro número saiu a 1 de Março de 1893. O proprietário era F. Lopes & Pimenta, o redactor principal Vidal Oudinot e a redacção estava situada na Rua de D. Pedro, nº 184, na cidade do Porto. Ou seja, podemos considerar que a imprensa desportiva portuguesa nasceu na “cidade invicta. O jornal foi editado durante praticamente dois anos, saindo o último número a 15 de Fevereiro de 1895. Em destaque o editorial da primeira edição, histórica no universo da imprensa desportiva portuguesa:

Avante sim!
O nosso espirito é morto, morto para as luctas e para a vida. É urgentissimo, é necessário que elle se avigore, que se revolte.
Um espirito novo de revoltado é como uma granada que rebenta no campo inimigo. É um clarim que vibra n´um grande descampado, onde um exercito de sibaritas ficasse dormindo, tranquilo, voluptuosamente e que elle, com a sua nota viva, irrequieta, estridula, viesse acordar aquelles espiritos mortos, aniquillados pela inacção.
E não haverá meios em que o espirito e o corpo possam sahir d`esse amollecimento desmoralisador e doente? Há-os e muitos.
A velocipedia, a gymnastica, a natação, etc., tudo isso são uns meios bons para o desenvolvimento physico da nossa organisação estiolada.
De entre tantos que se me affiguram verdadeiramente notaveis, eu ponho em primeiro lugar a velocipedia, pois que, acho-lhe dois motivos poderosissimos: o ser util e o ser agradavel.
A velocipedia em estes ultimos tempos tem-se generalisado espantosamente.
É pena que ainda o nosso meio burguez olhe para a bicycletta como um instrumento mau e desmoralisador. Mas isto são os espiritos velhos, felizmente, e estes mesmos, em breve se irão habituando a olhal-a mais complacentemente, em vista dos beneficios que d´ella advem.
Como exercicio muscular é superiormente notável: musculos das pernas, braços e peito desenvolvem-se espantosamente.
Como applicação medica ao corpo enfermo as curas são immensas e notaveis.
A paralisia parcial, rheumatismo, rachitismo, etc., têm tido tirado do exercicio velocipedico resultados maravilhosos!
Mas para que tudo isto se saiba, se vulgarise, é necessário recorrer à imprensa. É por isso que se fundou o “Velocipedista”.
Apresentamo-nos, pois, perfeitamente organisados, perfeitamente disciplinados, sem a menor ideia de ostentação, mas tambem sem tolas modestias que nos espiritos novos tão mal cabem, convictos do que valemos na empreza a que nos abalançamos.
Seguiremos passo a passo o progresso da velocipedia, demonstrando a pouco e pouco o alto papel que este meio de locomução virá a representar no futuro e mais para diante abriremos secções novas que, pela sua novidade, serão um “clou” palpitante, um verdadeiro acontecimento em o nosso pequeno meio velocipedico.
Contamos já com valiosissimas adhesões que de toda a parte nos chegam.
Essas adhesões e esses incitamentos são já o prenuncio d´uma era esplendorosa, que não vem longe, para a velocipedia em Portugal.
Avante, pois.

Logo no ano seguinte um grupo de associdados do Real Ginásio Clube Português resolve editar um jornal que servisse os interesses do clube e do desporto em geral. Desta forma é fundado o jornal O Sport, cujo primeiro número sai a 22 de Janeiro de 1894. Tinha como director Carlos Xafredo (o tradutor das regras do futebol para a língua portuguesa) e como editor Henrique Pinto do Amaral. Era um jornal que abrangia várias modalidades, conforme se pode comprovar no seu primeiro número, onde são publicados vários artigos dedicados a desportos como a equitação, a caça, a esgrima, a ginástica, o ciclismo, o futebol e os desportos náuticos. Teve uma vida breve, não tendo ultrapassado os quatro números. Apresentamos o editorial da primeira edição:

É com o maior jubilo que apresentamos á conscenciosa apreciação do publico o primeiro numero d´esta publicação, cuja ideia fôra há muito concebida, preoccupando o espirito de alguns enthusiastas pelo “sport”, mas que por uma serie de circumstancias não tinha tido até hoje realisação pratica.
Sem pretenções, como tambem com todo o desassombro e imparcialidade é somente a nossa mira, pôr ao facto do que se passa no mundo do “sport” os nossos amigos e leitores. Comprehendemos quão arriscada e trabalhosa é a tarefa a que nos vamos abalançar; esperamos porém, o vosso bom acolhimento, tanto mais, que é infelizmente tão mingoado no nosso paiz, o numero dos que já comprehendem as vantagens do exercicio physico.
O que mais nos anima a prosseguir, é o ter a consciencia plena, de não nos mover o espirito da ganancia estando animados do mais amplo desinteresse, e visando só, em augmentar o numero dos adeptos pelo desenvolvimento physico, que tão desprezado tem sido no nosso paiz, destoando assim tanto de todos os outros.
Não nos limitaremos somente a tratar dos exercicios ao ar livre, que, bem sabemos não podem ser usados por todos, mas sim trataremos conjunctamente da gymnastica, esgrima, nauticam velocipedia, caça, etc., para o que contamos com a coadjuvação dos nossos amigos.
Como homenagem a todos os individuos que por qualquer forma se distingam em exercicios de “sport”, publicaremos em cada numero um retrato photographico, ou grupos e scenas relativas ao “sport”.
Pedindo de novo a benevolencia do publico, concluiremos por offerecer a todos os “sportsmen” as colunnas do nosso jornal para os assumptos que elle se propõe tratar.

Estava dado o mote para o estabelecimento da imprensa desportiva em Portugal. Logo no ano seguinte, 1895, a Associação dos Atiradores Civis Portugueses (fundada a 16 de Novembro de 1893) resolve editar o seu orgão de informação oficial, intitulado O Tiro Civil, publicação de cariz semanal, cujo primeiro número foi editado a 7 de Março deste ano, e que durou até 1903. Tinha a redacção estabelecida no 1º andar da Rua de São Paulo, nº 216, em Lisboa, e tinha como editor Manuel Augusto Pinto. Destacamos um pequeno excerto do editorial da primeira edição do Tiro Civil:

...somos absoluta e completamente dedicados ao fim especial de darmos noticias e informações, que digam respeito ao tiro, á esgrima, á gymnastica, á caça, conservando-nos estranhos a toda e qualquer politica...

A 22 de Novembro 1896 é publicado em Lisboa o primeiro número do jornal O Velo-Sport, dedicado à divulgação do ciclismo, cujos proprietários eram Ignacio Lima e Carlos Portella, o editor dava pelo nome de Paulo da Fonseca e a redacção ficava situada na Rua do Arco do Bandeira, nº 211. Em destaque o editorial do seu primeiro número:

Ao apresentarmos á luz da publicidade este semanario, sentimo-nos possuidos d´uma profunda incerteza muitissimo justificada, em vista do mau sucesso que tiveram todos os jornaes que nos antecederam, tratando do mesmo assumpto.
É profundamente lamentavel que tendo o sport em geral, e a velocipedia em particular, tomado em Portugal um grande incremento n´estes ultimos tempos, não tenhamos um único jornal que se possa enviar para o estrangeiro, afim de que lá fora se possa ajuizar do estado de adeantamento em que o sport se encontra entre nós, tomando assim o logar que de direito nos pertence.
Indubitavelmente, existem no nosso meio distinctos sportmen, que podem competir com os estrangeiros, e ainda ultimamente o arrojado recordo Madrid-Lisboa, que tanta admiração causou, foi, apesar dos naturaes contratempos, um dos mais brilhantes de que temos memoria.
Appellamos, pois, para todos os cyclistas pedindo-lhes o seu valioso auxilio, tanto material como intellectual, e immenso será o nosso regosijo, se, compenetrando-se dos seus deveres, se levantassem do estado de apathia em que jazem.


A 14 de Janeiro de 1897, em resultado duma cisão ocorrida no jornal atrás citado, surge também em Lisboa o Sport Velo. A sua redacção ficava no Largo do Poço do Borratem, nº 13, o proprietário era J. da Costa Braga e o editor Paulo da Fonseca, que seria um dos dissidentes do Velo-Sport. O editorial do primeiro número, assinado pelo seu proprietário, J. da Costa Braga:

Este periodico não é novo.
A ardente dedicação com que temos trabalhado até aqui por animar o gosto pela velocipedia, patenteando e exaltando, algures, todo o esplendor do nosso bello “sport”, não pode ser-lhe contada como vida, propriamente, mas é, sem duvida, uma preexistencia que, conhecida ella, por si só basta para accentuar o caracter do recemnascido, e garantir a legitimidade dos nossos desejos.
Não queremos o nosso credito por mãos alheias, é o que affirmamos; e a corrente de sympathia, com que fomos acolhidos pelo “cycling” na nossa estreia, impõe-nos o dever de manifestarmos ao sport “Velo” que nem somos ingrato nem abandonaremos o nosso posto, desapparecendo como viemos.
Mantermo-nos pois devotadamente na derrota de propaganda, e na mais attrahente exposição, não só das novidades palpitantes que haja entre nós e no estrangeiro, mas tambem dos assumptos variados de que se pode tratar sobre o “Velo”, é o fim que procuraremos conseguir com geral agrado, acompanhando enthusiasticamente o progressivo desenvolvimento da nossa adorada velocipedia, e concorrendo para elle com quanto em nossas forças caiba.
Boa vontade não nos falta, já o provámos; fica tambem ao vosso dispôr o elemento principal de vida para os periodicos d´esta natureza – a typographia – o vosso auxilio, cyclistas, obterá d´esta fórma com segurança um resultado brilhante, e estamos certos que a rapida evolução d´este semanario poderá em breve reflectir nitidamente o incremento, avultado já, que entre nós tem tomado o cyclismo, trazendo ao nosso bando, mesmo no proximo verão, grosso numero de “propagadores pelo facto”.

Aos individuos, que aproveitando-se do nosso desinteressado trabalho pretendem ainda enxovalhar-nos com um desmentido torpe e porcamente sophismado, respondemos da seguinte forma:
Protestando contra o indigno desmentido dos proprietarios do “Velo Sport” empraso-os a que apresentem no seu periodico, visto eu ter sido “simples” collaborador, quaes eram os redactores, o principal d`entre elles, e tambem quaes os trechos que lhe pertencem.
Confrontando: a nota dos meus originaes assignados, não assignados, e das noticias por mim redigidas, como o farei no “Sport-Velo”.


Para terminar esta enumeração, destacamos também a publicação em Lisboa a 12 de Fevereiro de 1897 do primeiro número do jornal O Sport (não confundir com a publicação afecta ao Real Ginásio Clube Português), dedicado também à divulgação de vários desportos, com a redacção fixa na Rua do Crucifixo, tendo como responsável editorial Arthur dos Santos e como gerente Carlos Vieira d´Almeida.
Contudo, não se pense que o desporto só começou a figurar nas páginas dos jornais portugueses com o surgimento destes títulos enunciados. Jornais como o Diário Ilustrado ou o Jornal do Comércio também noticiaram os principais acontecimentos ocorridos no jovem mundo do desporto português de oitocentos. Por uma questão de cariz histórico, destacamos a notícia daquele que terá sido o primeiro jogo de futebol disputado em Lisboa a 22 de Janeiro de 1889 entre duas equipas, uma de portugueses e a outra com ingleses. A notícia vinha na edição de 23 de Janeiro de 1889 do Jornal do Comércio:

Uma quantidade enorme de pessoas foi hoje ao Campo Pequeno assistir ao desafio entre inglezes e portuguezes, ao” foot ball”. Grande número de carruagens com elegantes senhoras.
O resultado do jogo foi muito lisongeiro para os nossos compatriotas, que conseguiram ganhar a primeira partida, ficando a segunda empatada. Não faltaram os trambulhões e rebolões próprios do jogo, mostrando todos os fortes mancebos que n`elle tomaram parte quão exímios são no “manejo” do pontapé, como disse uma “elegante” que, por casualidade, ficou ao pé de nós.
O dia estava esplendido, mas um poyco ventoso. Quasi toda a gente foi, portanto, findo o “foot ball”, passear no Jardim Zoológico, onde se exhibia, de novo, a persa Mirra, uma rapariga muito gorda, com uma trunfa enorme, compridas barbas e o rosto completamente coberto de pello escuro.
A concorrencia no Jardim era enorme, como poucas vezes alli se vê. Todas as ruas cheias de gente. O buffete foi tomado de assalto, e às duas e meia já não havia sandwiches, sendo preciso que o proprietario mandasse a correr, à baixa, fazer novo fornecimento de salame, presunto, fiambre e pão de forma.Em summa, as duas diversões que hoje attrairam toda Lisboa foram o “foot ball” e o Jardim Zoológico.

Desporto em Portugal no final do século XIX - Os primeiros anos, os primeiros clubes, as primeiras vitórias

O panorama desportivo em Portugal no final do século XIX não era muito animador. A prática desportiva era algo praticamente desconhecido e inacessível para a esmagadora maioria da população, só algumas franjas da burguesia e da aristocracia eram adeptas e praticantes de desporto, e mesmo estas enfrentavam o preconceito dos seus pares sociais. Os sectores mais altos da sociedade portuguesa, conservadores e seguidores da moral e dos bons costumes, ignorantes das vantagens do exercício físico e do desenvolvimento e da implantação que o desporto estava a obter em países como a Inglaterra e a França, censuravam a minoria que insistia na prática desportiva, que procurava os espaços ao ar livre, que fugia do cinzentismo da cidade, que olhava para o desporto como um meio de convivio, para além das vantagens físicas e morais que dele poderiam advir.
O fraco desenvolvimento desportivo que sucedia em Portugal nesta época teria as suas raízes no século XVIII, quando, por motivos aparentemente inexplicáveis, os jogos e as actividades ao ar livre deixaram de fazer parte dos hábitos dos portugueses, o que provocou uma certa degeneração física e moral, conforme nos diz um clérigo deste tempo, o Padre Manuel Bernardes:

As espadas largas degeneraram em cotós, e os capacetes se trocaram em perucas; já o pente em vez de se fincar na barba ensaguentada se finca publicamente na cabeleira, alvejando com polvilhos. Cheiram os homens a mulheres; não a Marte, mas a Vénus. Quem havia de imitar o grande Albuquerque, prendendo a barba no cinto, se já não há novas de cintos; nem de barbas? Quem haveria de sair aos leões em África; se é mais gostoso estar no camarote em Lisboa, gracejando com as farsantes e atirando-lhes já com chiste, já com dobrões? Ou como se haviam adestrar em ambas as selas, andando pelas ruas bamboleando nas seges? Amoleceu-nos a infusão dos costumes estrangeiros, que veneramos, devendo aborrecê-los; e nós, que estamos no fim da terra, ficamos no meio do mar das suas depravações.

Esta degeneração física e moral prolongou-se pelas décadas seguintes, em virtude do desprezo que era dedicado à prática desportiva. Ramalho Ortigão, em 1875, dá-nos um testemunho disso mesmo, nomeadamente dos efeitos que a inactividade física tinha na juventude:

Os vossos filhos, vimo-los no liceu, no dia do primeiro exame, pálidos de concentração e de susto, imóveis, estáticos, com os olhos pasmados na espessura dos seus juízos, lembrando-se um pouco mais das orações que vós rezastes por eles, ó mães, do que das lições que vós lhes destes, ó mestres! Tinhamo-los também visto no Passeio Público, em noites de concerto, dançando ao pé do quiosque, eles fingindo-se grosseiros para se darem o chique dos velhos colegiais, elas sérias e graves, voltando o rosto por cima do ombro para contemplarem, como pequenas senhoras, a cauda hipotética dos seus vestidos. Elas e eles são pálidos, têm gengivas esbranquiçadas, os dentes baços, as pestanas longas, as pálpebras oftálmicas, os cantos da boca levemente feridos, o sorriso triste, os movimentos indecisos e fracos, o olhar quebrado. Precisam de tomar banhos frios, de comer carne ao almoço, de beber uma colher de óleo de fígado de bacalhau todos os dias, de fazer ginástica e de que se lhes corte o cabelo... E quanto à educação do espírito, sabem pouco e mal o que lhes ensinaram, não sabem quase nada o que deviam saber. Pelo que respeita ao corpo, se vêm de um bom colégio, sabe de ginástica o suficiente para fazer deles maus arlequins, mas nunca empregaram a sua força nos exercícios verdadeiramente úteis a um homem. Não estão habituados à fadiga das marchas, não sabem defender-se se os esbofetearem, não sabem nadar, desconhecem os princípios mais rudimentares da higiene... (1)

Também na literatura encontramos um testemunho ilustrativo deste sentimento de decadência física e psicológica que afectava as gerações mais jovens do Portugal oitocentista, conforme encontramos na obra Os Maias de Eça de Queiroz, editada no ano de 1888, e onde Afonso da Maia defende a adopção da tourada como desporto nacional, de forma a incutir na juventude o vigor e a coragem que a arte de lidar o toiro acarreta:

O verdadeiro patriotismo seria, em lugar de corridas, fazer uma boa tourada... Cada raça possui o seu “sport” próprio, e o nosso é o toiro: o toiro com muito sol, ar de dia santo, água fresca e foguetes. A vantagem da tourada é ser uma grande escola de força, de coragem e de destreza. Em Portugal não há instituição que tenha uma importância igual à tourada de curiosos. E acredite numa coisa: é que se nesta triste geração moderna ainda há em Lisboa uns rapazes com certo músculo, a espinha direita, e capazes de dar um bom soco, deve-se isso ao toiro e à tourada dos curiosos... Não temos o “cricket”, nem o “football”, nem o “running”, como os ingleses; não temos a ginástica como ela se faz em França; não temos o serviço obrigatório, que é o que torna o alemão sólido. Não temos nada capaz de dar a um rapaz um bocado de fibra, senão badamecos derreados da espinha a melarem-se pelo Chiado.

No entanto, e apesar da fraca tradição desportiva no Portugal oitocentista, começam a formar-se as primeiras associações ligadas à prática desportiva. Desta forma a 6 de Abril de 1856 surge a Real Associação Naval de Lisboa, no seguimento duma tradição de desportos náuticos, nomeadamente o remo e a vela, que já vinha do reinado de D. Maria II, sendo de referir que esta colectividade desportiva é actualmente a mais antiga da Península Ibérica. No entanto a prática de desportos náuticos não se limitava à capital do país, também no Mondego, ao largo da Figueira da Foz, e no Douro se organizavam regatas, e desta forma em 1876 é fundado o Clube Fluvial Portuense. A implementação dos desportos náuticos em Portugal ficou-se a dever, em grande parte, à comunidade inglesa instalada no nosso país, sendo esta realidade mais evidente na cidade do Porto.
Ainda na década de 70 é fundado em Lisboa outro clube histórico e que também perdurou até aos dias de hoje, o Real Ginásio Clube Português, fundado em 1875 e essencialmente vocacionado para os desportos acrobáticos, sendo de destacar a organização, a cargo deste clube, em 1885 do primeiro concurso nacional de ginástica, e que contou com a participação de várias associações e clubes, tais como os Bombeiros Voluntários, o Asilo Municipal, o Clube Gimnastico de Lisboa e a Casa Pia, instituição que teve também um papel importante na promoção da educação física em Portugal. Toda esta intensa actividade promovida pelo Real Ginásio Clube Português durante as últimas décadas do século XIX culminou naquela que terá sido uma das primeiras vitória internacionais do desporto português, a medalha de ouro ganha por João Possolo em 1893 numa competição de ginástica realizada em Badajoz.
Também o ciclismo teve grande adesão em Portugal nesta época, em 1891 é fundado o Real Clube Velocipédico de Portugal, logo seguido pelo Real Velo Clube do Porto, fundado pouco tempo depois. Em 1896 é inaugurado em Algés o primeiro velódromo português, solenemente baptizado “D. Carlos”, no ano seguinte é a vez da Póvoa de Varzim e do Porto inaugurarem os seus velódromos. Contudo, e no que diz respeito à “velocipedia” (termo usado na época para designar o ciclismo), é obrigatório realçar o nome de José Bento Pessoa, ciclista profissional na equipa francesa do Phoebus desde 1898, vencedor de inúmeras corridas em países como Espanha, Itália, França e Brasil, e recordista mundial dos 500 metros em pista, recorde batido em 1899 no velódromo de Chamartin, em Madrid, tornando-se desta forma no primeiro recordista mundial do desporto português (2).
Em relação à modalidade “rainha” do actual panorama desportivo português, aquela que mais paixões desperta, o futebol, é também neste período que encontramos o seu momento de fundação. A primeira vez que se terá praticado futebol em Portugal terá sido em 1875, por iniciativa do cidadão inglês Harry Hilton, que reuniu um grupo de amigos no campo da Achada, junto à localidade da Camacha na ilha da Madeira, para disputarem um “jogo da bola”, facto ainda hoje recordado por uma placa evocativa presente no local. Esta iniciativa não terá tido seguimento pois, segundo rezam as crónicas, a bola usada nesta partida terá ficado completamente desfeita. Ou seja, teremos de considerar a ilha da Madeira como o berço do futebol em Portugal, e mais uma vez a influência inglesa a fazer-se sentir nas primeiras páginas de história do desporto português. À semelhança do que se tinha passado com os desportos náuticos, também no futebol a presença britânica é uma constante nos seus primórdios. Alguns anos mais tarde, em 1882, a população de Lagos assiste a um jogo de futebol disputado entre as tripulações de dois navios ingleses que estavam atracados nesta cidade algarvia. Em 1886 os irmãos Pinto Basto – Guilherme, Eduardo e Frederico – membros duma abastada família lisboeta, com negócios no ramo da navegação, ao regressarem dos seus estudos em Inglaterra trazem consigo aquela que terá sido a primeira bola de futebol vista em Lisboa, e cedo despertam junto dos seus amigos o gosto pelo “jogo da bola”, que se disputava regularmente nas quintas do Bonjardim e da Fronteira situadas na zona de Belas. No entanto, em Outubro de 1888 os irmãos Pinto Basto juntamente com os seus companheiros resolvem fazer uma apresentação do futebol à sociedade lisboeta, e para isso promovem um ensaio em Cascais, nos terrenos da Parada junto à Cidadela. Esta demonstração terá tido algum sucesso, o que levou a que a 22 de Janeiro de 1889 se organizasse um jogo, com um cariz mais sério e formal, entre duas equipas, uma de portugueses e outra de ingleses, vindo estes últimos da Casa Graham e do Cabo Submarino de Carcavelos. A partida disputou-se em Lisboa, no Campo Pequeno, nuns terrenos onde actualmente está situada a praça de touros, e terminou com a vitória da equipa portuguesa por 2-1. Ainda neste ano o Real Ginásio Clube Português abre uma secção de futebol para que os seus associados pudessem praticar esta modalidade que começava a despontar em Portugal. Com o “Ultimatum” inglês de 1890 tudo o que representasse a Inglaterra era visto com maus olhos pela sociedade portuguesa, no entanto, o futebol, apesar da sua origem inglesa, conseguiu de certa forma passar imune a esta onda anti-britânica, e é precisamente nos primeiros anos da década de 90 que assistimos, nas duas principais cidades do país, Lisboa e Porto, ao surgimento dos primeiros clubes e grupos dedicados ao futebol:, logo em 1890 forma-se o Club Lisbonense, primeiro clube exclusivamente dedicado ao futebol; em 1893, só em Lisboa, são fundados cinco clubes, o Estrela Football Club, o Club Braço de Prata, o Clube Tauromáquico, o Football Club Esperança e os 40 da Era, enquanto que no Porto surgem o Oporto Cricket Club e o F. C. do Porto; entre 1895 e 1896 surgem, também na capital portuguesa, o Académico Futebol Club, o Futebol Clube Alcantarense e o Campo de Ourique; enquanto que em 1898 assistimos ao alastrar do entusiasmo pelo futebol a outras cidades do país, e em Viana do Castelo é fundado o Sport Clube Vianense. Em 1894 é o próprio rei D. Carlos que patrocina a primeira taça disputada em Portugal, a Taça d´el Rei, disputada no dia 2 de Março por uma equipa de Lisboa e por outra do Porto, inserida nas comemorações do V centenário do nascimento do Infante D. Henrique, e que terminou com a vitória dos lisboetas por 2-0. De referir que muitos destes grupos e clubes de futebol tiveram vida breve, não chegando, a maioria, ao início do século XX (3). É precisamente neste século, ultrapassada esta primeira fase oitocentista, onde o amadorismo era o principal condimento, que o futebol português, e o desporto em geral, aliado ao fenómeno do associativismo, inicia uma longa caminhada de vitórias e de derrotas, de alegrias e de tristezas, mas caminhando sempre em direcção ao coração dos portugueses, que têm nos desportistas portugueses um dos seus principais motivos de orgulho, ou não fosse Portugal o berço de campeões olímpicos como Carlos Lopes e Rosa Mota, ou a pátria duma figura mundialmente famosa, como é Eusébio da Silva Ferreira.

1 – Cf. SIMÕES, António; SERPA, Homero – Glória e Vida de Três Gigantes, ed. jornal A Bola, 1995, (págs. V-VII).

2 – Cf. Portugal Contemporâneo, dir. António Reis, Volume I, ed. Publicações Alfa, 1996, (pág. 772).

3 – Cf. COELHO, João Nuno; PINHEIRO, Francisco – A Paixão do Povo – História do Futebol em Portugal, ed. Afrontamento, 2002, (pags. 49-60).

Monday, May 28, 2007

Reportagem sobre o MAN

Esta reportagem sobre o Movimento de Acção Nacional, da autoria do jornalista Paulo Costa, foi publicada no jornal Tal & Qual, edição de 6 de Janeiro de 1989.

ELES NÃO BRINCAM AOS FASCISTAS

Chamam-lhes fascistas, ou até mesmo nazis, só porque se saúdam entre si de braço ao alto, se proclamam antidemocráticos e se assumem como racistas; mas eles preferem dizer que hão-de ser uma alternativa face a um «sistema podre», identificam-se mais com o «espírito inicial» do 28 de Maio de 1926 («que derrubou a partidocracia vigente») e dão Primo de Rivera e Rolão Preto como referência.
Eles são jovens, começam a ser muitos, e formam o Movimento de Acção Nacional. O «T&Q» foi ver quem são e como pensam estes jovens nacionalistas portugueses

Eles chamam-se Luís Paulo Henriques, Nuno Oliveira, António Rodrigues, Germano Tralhão. Têm 26, 23, 19, trinta e poucos anos. São todos solteiros, bons rapazes e muito apegados à família, católicos ou sem credo religioso. Quase todos trabalham, e não dão mostras de abastança, mas antes sinais de vidas feitas com sacrifício.
Formam os corpos directivos do Movimento de Acção Nacional. Luís Paulo é o presidente. É em sua casa que a conversa com os jornalistas do «T&Q» tem lugar, num suburbano rés-do-chão no centro da Amadora. De um lado da sala, está uma cristaleira e dois guarda-loiças dos anos cinquenta e algumas cadeiras que já viram melhores dias; do outro lado, debaixo da bandeira negra com a cruz céltica bordada a branco e de alguns cartazes do movimento, frente a uma mesa de sala coberta de um simples pano creme, fala-se de «revolução» e de «conquista do poder».
Na melhor tradição das conferências de imprensa, é Luís Paulo que faz quase toda a conversa. Exprime-se melhor que muitos jovens políticos no poder e vê-se que tem leituras e bagagem cultural. Responde a todas as perguntas, está à vontade entre temas como racismo e violência, e referências a Hitler, a Nietzsche ou a Salazar.
O Movimento de Acção Nacional – explicou-nos ele – foi legalizado como associação por uma escritura pública efectuada na Amadora em Junho de 1985. Surgiram da reunião de vários grupos de jovens e eram menos de quarenta quando começaram. Hoje, são «largas centenas», preferem não especificar.
Estão organizados em termos de células e só não têm núcleos de activistas na Madeira e em três distritos do interior (Bragança, Vila Real e Guarda).
Dentro de dois ou três meses, esperam realizar o seu primeiro congresso. Ainda este ano querem abrir uma sede em Lisboa. Aliás tudo indica que serão dois locais, um reservado, como é evidente, não porque tenham medo, já que «tudo o que fazem é legal» e «quem não deve não teme», mas por em termos de locais públicos lhes ser «mais complicado trabalhar».
O Movimento de Acção Nacional – dizem-nos – é autofinanciado. Todo o dinheiro lhes vem das vendas de material, das quotizações, eventualmente de alguns donativos. Têm o «dinheiro necessário» para fazer o que se propuseram, mas não revelam orçamentos. Ninguém diz, e eles não serão os primeiros.
Têm também «ligações internacionais», formais e directas, com três movimentos congéneres: a Frente Nacional inglesa, o NPD alemão (mais com a juventude nacional democrata) e com o Partido Nacionalista Francês e Europeu, com o qual estão a preparar um folheto para ser lançado em França entre os emigrantes, de um lado é português…
O Movimento de Acção Nacional prepara «uma revolução». Está hoje a formar os homens - «os seus soldados políticos» - para construir «a alternativa nacionalista face ao sistema que hoje existe em Portugal». O seu objectivo final «é a conquista do Poder». Não é tarefa para um ou dois meses: «pode demorar dez anos ou mesmo vinte, o tempo que for preciso».
Eles já estão «a preparar tudo», porque entendem que «o que é preciso é alterar a situação e unir o povo».
Os partidos, consideram, «servem para dividir o povo, para conquistar parcelas de poder». Criticam por isso a «partidocracia» e assumem-se do lado de fora do leque partidário. Querem «organizar-se de uma maneira diferente» e «unir o povo, conquistar o Poder, não tomar uma parcela de Poder momentaneamente».
Não pretendem concorrer a eleições, nem sequer a eleições académicas. «Esta sociedade» - dizem - «está caduca e é preciso mudá-la». Querem por isso construir «uma nova sociedade, com um novo tipo de homem, que tem de ser educado para isso». É o que «estão a fazer agora a si próprios» e o que «vão fazer às outras pessoas».
«E seremos poder, quando o povo manifestar adesão popular às nossas ideias».
A adesão aos seus princípios de grandes alas juvenis já lhes «é evidente». Controlaram já algumas escolas, nomeadamente em Castelo Branco. E controlam hoje algumas associações de estudantes, «através de activistas nossos que são presidente de associações».
Entre as associações estudantis, acham aliás que «estão em todo o lado», mas não enveredam nunca por movimentos «eleitoralistas», nem assumem listas próprias.
«Também não é mentira que estejamos implantados em algumas claques de futebol dos clubes mais representativos. Temos elementos nossos que vão ao futebol e que se incluem nas claques, mas não é nada organizado, porque não tem de ser».
Depois, a pouco e pouco, hão-de pedir outras coisas ao povo. «Hoje, já há dois milhões de portugueses que não votam, mais trezentos ou quatrocentos mil que votam nulo ou em branco…»
A sua revolução, dizem-no e nisso parecem acreditar firmemente, «avançará como o vento».
Contra «um sistema igualitarista», contra «esta sociedade que não interessa, porque é violenta, porque é repressiva, porque nela abunda a droga, a delinquência e nada se faz para combater isso», eles, nacionalistas portugueses apresentam «toda uma outra visão da sociedade».
Não lhes interessa a representação parlamentar, o voto como forma de participação no Governo «como é que se pode dizer que um deputado por Bragança representa trinta mil pessoas se ele está aqui em Lisboa e muitas vezes nem sequer é de lá»
Pretendem, isso sim, «que o povo participe através das associações populares de base, dos sindicatos, das corporações, dos municípios, que esses sabem o que é preciso fazer e até dão bons exemplos, mesmo no sistema em que vivemos».
Em vez do sufrágio universal, «um Estado corporativo». Os partidos que existem – dizem – «têm tendência a ser reformistas». E eles, o que querem é «destruir o que está podre, o que está velho, e construir de novo».
«É preciso revolucionar» - proclamam. Ai está «o radicalismo nas ideias», e «é por isso que às vezes são conotados com a violência, ou a extrema-direita».
Assumem-se como «duros», como «radicais», como «rebeldes». Mas não se entendem nem como violentos, nem como extremistas.
Combatem A, B, C, mas sempre «através das ideias, da escrita e do diálogo», porque a sua «postura» é a de serem «cordiais» e traçarem «o seu próprio caminho».
A violência física «poderá ser uma situação em que sejam colocados», porque «o sistema dificilmente sairá sem reagir» e «nessa altura terão que se defender».
Agora não dizem que «vão planear golpes ou coisas desse género», porque não lhes interessam «acções putchistas do tipo Terrero Molina».
«É mais importante a força das ideias, e o combate positivo, organizado, através de todos os meios legais, do que resignar a acções violentas».
Também por isso, dizem «deplorar» incidentes como os ocorridos recentemente com alguns “cabeças-rapadas” que também integram o seu movimento.
Não são nem querem ser «uma milícia armada». «Ter armas era apenas dar razão àqueles que lhes querem arranjar problemas» declaram, e de momento «só vêem acção dentro das normas legais», mesmo que «não concordem com algumas».
Quanto aos que os apontam como de extrema-direita, dizem que «todas as ideias que têm a ver com as reais necessidades do povo nunca serão de esquerda nem de direita, mas, quando muito, nacionalistas».
Onde eles estão é «do lado de fora, no ponto de intercepção entre a extrema-esquerda e a extrema-direita». Isto nas palavras de José António Primo de Rivera…
É também por isso que não se identificam nem com Salazar nem com Hitler. Podem até admirá-los por algumas das suas políticas, mas tantos anos depois, o que dizem é que «não vale a pena recalcar o passado» e não querem «ressuscitar cadáveres».
«Até porque não queremos andar toda a vida com a cruz às costas, e sermos os fascistas, os maus, apenas porque temos outras ideias…»
Por isso, as suas preferências vão todas para as revoluções populares europeias dos últimos cinquenta anos.
Identificam-se ainda assim talvez mais com «o espírito revolucionário do 28 de Maio de 1926». Porque «foi uma revolução, e não apenas militar. Quem fez aquela revolução foi o povo, que estava farto da partidocracia, que estava farto que se queimassem igrejas, que se mudassem ministros e presidentes a torto e a direito e daquela cambada toda de maçons e judeus».
São assim os jovens nacionalistas portugueses. Saúdam-se de braço erguido, ao alto, à nazi, ou à romana, como eles preferem dizer, mas não o fazem para a fotografia, porque «não gostam de encenações».
O seu futuro próximo será para «consolidar a força do movimento». Para daqui a dez anos, sonham com «uma organização diferente, com outro poderio».
Depois, querem começar a «alterar o curso dos acontecimentos», através da «força das ideias, do movimento popular».
Com uma «elite política», uma «minoria organizada». Porque «a revolução será obra de uma minoria decidida e inacessível ao desencorajamento» …

CIGANOS OLÉ!

«Portugal para os portugueses» é um dos «slogans» do Movimento de Acção Nacional. Para atender a esta reivindicação, os jovens nacionalistas portugueses propõem por isso o repatriamento imediato de cabo-verdianos, indianos, angolanos, moçambicanos, etc., etc.
Não consideram no entanto que o conceito de raça que professam derive de alguma leitura apressada do «Mein Kampf»:
«O que nós dizemos é que cada continente tem determinadas características geográficas e culturais. Normalmente, cada continente tem também um determinado tipo de pessoas, mais escuras ou mais claras».
A Europa – defendem – «é um continente de brancos». E eles consideram-se europeus, «têm orgulho em ser brancos» e «é isso que querem preservar». Portanto, repetindo sempre que «não têm nada contra ninguém», o que dizem é que «as pessoas não se devem misturar. Se há um determinado tipo de pessoas, se há outro, o que não se pode permitir é que haja mesclagens, porque, ao misturar duas raças, elas deixam de existir, puras».
Não que, como brancos, «se achem superiores ou inferiores». Mas julgam-se no direito de «preservar» a sua raça, a sua cultura e as suas tradições. Assumem-se como «diferentes».
Por causa disso, não condenam «as relações de amizade», não condenamos «que brancos e negros vivam em comunidade» (o que aliás consideram «extremamente difícil, porque toda a gente sabe dos conflitos que há em África, entre as próprias tribos de negros, e os conflitos que há nas sociedades multiraciais»).
Daí que entendam que «deve haver um repatriamento massivo para determinados países de origem».
«Portugal não pode continuar a suportar refugiados angolanos, moçambicanos e não sei quê, e pagar-lhes ali as despesinhas todas» - dizem. Citam Rodrigo Emílio, um dos seus teóricos preferidos: «Dantes havia um sonho, que se tornou impossível. Eles quiseram que fosse assim. Então, Portugal neste momento não tem que ter responsabilidades nenhumas».
«Hoje, nós estamos aqui e é esta a nossa terra. A nova geração de portugueses não tem sequer que pagar pelos traidores que fizeram a descolonização».
Consideram também o «problema demográfico», e dizem por isso não poder concordar que «uma família de portugueses tenha um ou dois filhos, como hoje já é normal, e uma família de negros ou de indianos que viva nas barracas tenha sete, oito, nove ou dez, quando não há condições para isso».
«Há que criar certas e determinadas limitações» - concluem. Não que a eles os mova «nada contra as pessoas, contra aquilo que eles são, os cabo-verdianos, por exemplo». Pelo contrário, eles «até os querem preservar». Para isso, até citam uma organização negra americana que diz que «os negros devem voltar para África, e não se devem misturar…»
Talvez por isso, a única «raça estranha» que os nacionalistas portugueses dizem respeitar, senão admirar mesmo, de certa maneira, é a dos ciganos: «Um povo nómada, que mantém a sua cultura e a sua tradição, e que normalmente não se mistura com quem não seja do seu meio».

POLÍTICOS

Os jovens nacionalistas portugueses têm pontos de vista muito próprios acerca das figuras políticas e da própria situação política portuguesa, tanto do passado como do presente.
Em resumo, é isto o que eles, pela voz dos seus dirigentes, pensam de:
CAVACO SILVA - «Tenta ser relativamente populista, quer dar aquela imagem, por isso tem tempos de antena todos os dias nos “Telejornais”, às vezes até em situações caricatas (no outro dia, esteve a dar cinco minutos de notícias no “24 horas”, a falar do Panamá e da América do Sul, sempre com a fotografia dele). Pronto, chegou lá, prometeu muito, não fez nada, é só mais um homem com um elo emprego».
MÁRIO SOARES - «É uma pessoa que pouco ou nada tem a ver com a realidade, ligado à Maçonaria quando 95% dos portugueses são católicos. Antes do 25 de Abril, teve um passado político de combate, mas consta que teve também umas atitudes desonestas em relação a certos símbolos nacionais».
«De resto é uma pessoa que sabe dar os seus belos golpes de rins, aliás provou-o. No actual sistema acaba por ser apenas um boneco, representa, mas não sabe bem o que representa. Além disso, deve ser o português que mais viaja».
«Às vezes, oferece-se aí umas medalhas a título póstumo. Quanto a Mário Soares, um dia, talvez não seja já no seu tempo, se Deus quiser há-de fazer-se o julgamento dele, e de outros homens que fizeram actos como a descolonização, para responder por todos os crimes, pelo milhão de mortos de Timor, pela descolonização exemplar, pelo terrorismo que existe em Portugal».
ÁLVARO CUNHAL - «Está a caminhar para o lado contrário e assim irá continuar toda a vida, há-de morrer agarrado aquilo». Mas «eventualmente saberá o que quer, tem os seus princípios» e, embora «lhes repugne», respeitam-no por isso, «porque de certa maneira tem tido até uma postura mais recta do que outras pessoas».
PSD - «É mais um partido como os outros, um bocado do sistema mesmo, uma máquina que dá de comer a muita gente e paga bons ordenados».
CDS - «É aquela direita conservadora que parou no tempo. Marca passo, e está ali e já não vai para lado nenhum, como está mais que provado».
PS - «É aquele partido que foi feito para ser poder e não o é. Por isso tem montes de pessoas lá dentro que não sabem o que hão-de fazer, e que entretanto ajudam a destruir o seu próprio partido. De resto, é apenas mais um partido de esquerda».
PC - «É um fóssil vivo. Continua a ser o que era há cinquenta anos e está a envelhecer. Tem uma grande máquina, sim senhor, mas é um partido caduco e está a perder toda a influência que tinha».
A DIREITA PORTUGUESA - «Politicamente não existe, porque ou alinha com a esquerda, e tem por exemplo uma política externa de esquerda, ou tem medo. Sobretudo, além de conservadora, é extremamente passiva. Limita-se a não fazer nada, não ser nada e entrar no joguete dos outros. O que é que representa aquilo que seja passivo, quieto, que não faça durante não sei quanto tempo, à parte umas situações corruptas que por ai vão havendo?»
SALAZAR - «É uma pessoa que na história contemporânea portuguesa tem realmente a sua importância. Foi um grande estadista, cometeu erros como toda a gente, mas foi de longe muito mais eficaz durante anos que toda esta cambada».

Friday, May 25, 2007

Juventude Leonina - Esboço duma possível história (cont.)

O início dos anos 90 significam para a Juventude Leonina a transferência da mítica Ponta Sul para a Superior Sul do Estádio de Alvalade, isto já no mandato de Sousa Cintra, eleito em 1989, depois de um período de grande turbulência directiva e desportiva motivada pela direcção do polémico Jorge Gonçalves, que dirigiu o clube durante a época 1988-89. É também neste período que se começam a falar pela primeira vez de infiltrações de extrema-direita nas claques de futebol, e a Juventude Leonina não foi excepção, e começaram-se a ver bandeiras com cruzes celtas junto das faixas da claque. Se estas bandeiras neo-nazis tinham de facto algum significado político ou se não passavam de simples exibicionismo, é uma questão que se pode colocar. De qualquer das formas, e servindo de simples registo histórico, a foto mais antiga onde se pode observar este tipo de simbologia junto da claque refere-se a um Sporting-Benfica da época 1988-89, disputado na penúltima jornada deste campeonato, ganho pelos benfiquistas, e onde o clube da Luz venceu por dois golos sem resposta.

Wednesday, May 23, 2007

Juventude Leonina - Esboço duma possível história

A Juventude Leonina é, actualmente, o mais antigo grupo organizado de adeptos em Portugal. Tendo sido fundada em 1976 pelos filhos do então presidente do Sporting, João Rocha, de inicio não seria mais que um grupo de jovens que entre si partilhavam afinidades clubísticas e de amizade, até porque muitos seriam colegas no colégio São João de Brito em Lisboa. De início, e ao contrário do que se veio a verificar mais tarde, as principais influências vinham das torcidas organizadas do Brasil, de certa forma dando continuidade a uma tradição de apoio organizado que já existia em Alvalade na década de 70, com os célebres Vapores do Rego, um grupo de jovens brasileiros que se destacava pelas suas alegres batucadas e que ajudaram a equipa a vencer o campeonato de 1973-74, equipa onde pontificavam, entre outros, Vítor Damas e Hector Yazalde. Ou seja, as influências inglesas (através da cultura hooligan) e italianas (pelo exemplo dos grupos ultra) vieram mais tarde, mais concretamente no início dos anos 80. Ainda no que diz respeito aos primeiros anos de vida da Juventude Leonina, a sua formação estava integrada num projecto de grande dinamismo que o presidente João Rocha trouxe ao Sporting, que se traduziu na construção de grandes equipas de futebol, que culminaram nas "dobradinhas" de 1973-74 e 1981-82, para além do título de 1979-80, e num ecletismo que implicou as vitórias no hóquei em patins, no andebol, no basquetebol, no atletismo e em muitas outras modalidades, convém não esquecer que em 1986, quando João Rocha abandonou a presidência do Sporting, o clube contava com mais de 100 000 sócios. Nos primeiros anos da década de 80, a claque encontrava-se situada na Superior Sul do Estádio de Alvalade, tendo passado, por volta dos anos de 1983/1984, para a célebre Ponta Sul. Neste período já encontramos a claque com uma maior organização, começam a surgir as primeiras faixas, as primeiras bandeiras com simbologia alusiva à claque e a utilização regular de fumos, seguindo o modelo italiano dos grupos ultra. Toda a cor e alegria que a Juventude Leonina trazia aos estádios portugueses fez com que nos outros clubes começassem também a surgir grupos organizados de apoio, compostos essencialmente por jovens, como foi o caso dos Diabos Vermelhos no Benfica fundados em 1982, dos Dragões Azuis no F. C. Porto, fundados também no início da década de 80, da Fúria Azul no Belenenses e dos Panteras Negras do Boavista, fundados em 1984, da Alma Salgueirista do Salgueiros e da Mancha Negra da Académica de Coimbra, fundadas em 1985, ou seja, na primeira metade da década de 80 quase todos os clubes que disputavam a primeira divisão contavam com uma claque organizada, sendo de referir que só no Sporting chegaram a existir em simultâneo, por volta de 1986,quatro grupos reconhecidos oficialmente pela direcção sportinguista (Onda Verde, Força Verde, Norte Leonino e Juventude Leonina), para além daqueles que não contavam com o apoio oficial (por exemplo, a Torcida Verde fundada em 1984, cujos fundadores chegaram a militar na Juve Leo, e que só viu o seu apoio reconhecido a nível oficial em 1988). Toda esta proliferação de claques organizadas culminaram nos Congressos Nacionais de Claques organizados nos anos de 1984 e 1985.
Os anos 80 significam para o Sporting o início do longo jejum no que diz respeito a títulos no futebol sénior. Com excepção das vitórias alcançadas na gloriosa época de 1981-82, só há a destacar a vitória na Supertaça da época 1986-87, resultante da presença na final da Taça de Portugal perdida para o eterno rival Benfica. Mas foi também na década de 80 que as claques de futebol se instalaram definitivamente no imaginário desportivo português, constituindo o Estádio de Alvalade um exemplo para os restantes clubes no que diz respeito a apoio organizado. Foram várias as claques portuguesas que adoptaram o nome "Juventude", ou até mesmo o diminutivo "Juve" (ex: Juventude Bracarense no Sporting de Braga, ou Juve Negra no Tirsense), influenciadas, muito provavelmente, pela dinâmica e capacidade de organização que a Juve Leo demonstrava, às quais não seria alheias certamente as ligações familiares dos fundadores da claque.Começaram também nos anos 80 as deslocações ao estrangeiro por parte da Juventude Leonina, a primeira terá talvez sido a Sevilha na época 1983-84 em jogo a contar para a Taça UEFA. Seguiram-se outras como Auxerre (1984-85), Roterdão, Bilbao (ambas na época 1985-86), San Sebastian (com a Real Sociedad em 1988-89) e a Nápoles (1989-90), onde na equipa local pontificava um senhor de nome Diego Armando Maradona... Contudo, ficaram também célebres as noites europeias de Alvalade, donde se podem destacar os jogos com Athletic de Bilbao, Barcelona, Atalanta, Ajax e o já referido Nápoles de Maradona.No entanto, o apoio dado pela Juve Leo ao clube não se limitava ao futebol, e desta forma modalidades como o hóquei em patins ou o andebol (sendo de recordar no caso específico do andebol a final da Taça de Portugal da época 1988-89, disputada em Loures contra o eterno rival da 2ª Circular) também beneficiaram da presença da claque no pavilhão ou na nave do antigo Estádio José de Alvalade.

Subsídios para a história da extrema-direita em Portugal no pós-25 de Abril

O Movimento de Acção Nacional

Em Junho de 1985 um grupo de jovens da zona da Amadora regista no cartório a Associação Cultural Acção Nacional, cujos princípios consistiam na “defesa dos valores nacionais, étnicos, culturais, éticos e espirituais”. Este grupo de jovens era constituído por Vítor Santos, Manuel Andrade, Alexandre Freire, Paulo Sequeira e José Luís Paulo Henriques, sendo que a ideia de organizar uma associação deste cariz partiu deste último, que já tinha militado na Juventude Centrista, e que se destacava dos restantes pela sua força de vontade e dinâmica, e desde cedo “Zé Gato” (alcunha pela qual também era conhecido José Luís Paulo Henriques, pelas semelhanças futebolísticas que tinha com o antigo guarda-redes benfiquista) tomou em mãos a direcção do grupo. Posteriormente a associação passou a designar-se Movimento de Acção Nacional (MAN) e começa a dar os primeiros sinais de dinamismo, reflectindo-se na edição do seu primeiro órgão de informação, o jornal Acção, isto já no ano de 1986, sendo mais tarde substituído pelo Ofensiva. Naquele que foi o primeiro jornal do movimento podia-se ler que “o MAN caracteriza-se por uma Terceira Atitude, que se coloca em oposição ao Capitalismo e Socialismo”, sendo o seu lema, impresso nos cartazes que já começavam a povoar as paredes da zona de Lisboa, “Nem Capitalismo! Nem Comunismo! Terceira Via! Por Portugal!”. Esta atitude de inconformismo aliada à divulgação de propaganda provoca a adesão de muitos jovens, entre os quais um grupo de jovens de Almada, que tinham em comum o gosto pela cultura skinhead, e que em 1987 resolvem aderir ao MAN. Ainda neste ano, e aproveitando a dinâmica que a adesão dos primeiros skinheads provocou, é editado o primeiro número do Combate Branco, dirigido aos militantes mais radicais do movimento. A influência do MAN chega ao Norte do país, onde começam a surgir os primeiros militantes, e onde surge a primeira publicação, intitulada Vento do Norte. Esta junção com os famigerados skinheads veio a provocar vários dissabores ao MAN, que aos olhos da sociedade portuguesa foi sendo visto como uma organização de extrema-direita composta em grande parte pelos chamados "cabeças rapadas", que se caracterizavam (pelos exemplos vindos do estrangeiro, nomeadamente de Inglaterra, onde nasceu, nos anos 60, esta subcultura) pela violência e pelo racismo. Em 1989 começam a surgir os primeiros problemas, ao mesmo tempo que começam a surgir as primeiras cruzes celtas (símbolo adoptado pelo MAN) nos estádios de futebol, sinal da influência que os skinheads começavam a ganhar nas claques dos principais clubes portugueses. Em Maio deste ano o actor João Grosso é agredido por um grupo de sete skinheads em Lisboa, tendo perdido um testículo em resultado do espancamento, sendo de referir que João Grosso estava a socorrer um outro jovem que estava a ser agredido pelo mesmo grupo. A comunicação social começa a reportar alguns episódios de turbulência na noite lisboeta, nomeadamente confrontos no Bairro Alto, mas é a 28 de Outubro que se dá o acontecimento que, muito provavelmente, levará à auto-extinção do MAN. Neste dia um militante do Partido Socialista Revolucionário (PSR), José Carvalho, é esfaqueado junto ao coração mesmo à porta da sede deste partido, na Rua da Palma em Lisboa, o que provocou a sua morte. Tudo terá acontecido quando um grupo de skinheads oriundo da Margem Sul forçou a entrada na sede do PSR, onde estava a decorrer um concerto promovido pelo partido inserido numa campanha contra o militarismo. O autor do golpe fatal terá sido Pedro Grilo, condenado a 12 anos de prisão por homicídio voluntário qualificado no julgamento que decorreu no Tribunal de Monsanto a 21 de Março de 1991, presidido pelo juiz Ricardo Cardoso, e onde foram também condenados Américo Silva (pena de 7 anos), Melchior Santos (6 anos) e Gabriel Ferreira (5 anos), os três condenados pelo crime de ofensas corporais e co-autoria da morte do militante do PSR. Filipe e Miguel Temporão foram condenados a 18 e 15 meses de prisão, respectivamente, mas com pena suspensa, Francisco Mascarenhas e Carlos Mariani foram absolvidos. Pedro Grilo sempre reclamou inocência, e a faca que provocou a morte de José Carvalho nunca foi encontrada. Cinco meses depois de ter sido condenado Pedro Grilo evade-se da cadeia do Linhó, dentro do carro da roupa suja juntamente com outros dois reclusos, sendo desconhecido até hoje o seu paradeiro. Mas os incidentes não se limitavam à cidade de Lisboa, também no Porto os skinheads faziam estragos. A 19 de Novembro de 1989 o angolano Francisco Faustino é espancado na zona da Boavista, sendo posteriormente abandonado, inconsciente, na linha férrea. Também neste dia dois cidadãos espanhóis são agredidos pelo mesmo grupo no centro comercial Brasília. O caso relativo a Francisco Faustino é levado também a julgamento, são constituídos 12 arguidos, sendo a decisão proferida a 14 de Abril de 1997, não chegando a condenar à prisão nenhum dos envolvidos, ora por falta de provas, ora devido a amnistias. Já a terminar o ano de 1989, talvez o mais atribulado da história do MAN, um jantar organizado no Porto a 1 de Dezembro, que visava uma maior aproximação entre a estrutura dirigente do movimento, situada em Lisboa, e os militantes nortenhos, acaba em confrontos entre os dois grupos, o que denotava a fragilidade da base de apoio do MAN. Sensivelmente no mesmo período José Luís Paulo Henriques tenta uma demarcação dos skinheads, e apela a uma maior discrição por parte dos militantes mais radicais, o que não é bem recebido por alguns dos membros do MAN, que abandonam o movimento para formar a Frente de Defesa Nacional (FDN), no entanto esta última não consegue ter o impacto que o MAN teve na sociedade portuguesa no final dos anos 80. A actividade do movimento reduz-se drasticamente, e só volta às páginas dos jornais em 1993 quando o Ministério Público solicita ao Tribunal Constitucional a extinção do MAN por ser uma organização que perfilha a ideologia fascista, proibida pela Constituição Portuguesa, aliada aos acontecimentos violentos que alguns dos seus militantes protagonizaram em Lisboa e no Porto. A 20 de Setembro deste ano começa o julgamento, onde os antigos dirigentes do MAN assumem a admiração pelo Estado Novo de Salazar, mas recusam a conotação com o Fascismo e com a violência dos skinheads, não desmentindo, porém, a infiltração destes no movimento. No início de 1994 o Tribunal Constitucional indefere o pedido de extinção do MAN pelo Ministério Público por ter chegado à conclusão que este já se encontrava extinto.


A extrema-direita e as claques de futebol

Mas se os anos 90 viram o desaparecimento do MAN, também viram o surgimento da extrema-direita em grande destaque noutros palcos, desta vez menos políticos e mais desportivos. Em 1991, Gaspar Fernandes, responsável operacional da PSP pelo policiamento dos estádios da Grande Lisboa, confirma em entrevista ao Diário de Notícias a presença de elementos da extrema-direita nas claques dos grandes clubes portugueses. Mário Machado, skinhead que vem a ter um enorme protagonismo anos mais tarde, terá tomado contacto com esta ideologia sensivelmente nesta altura, e terá sido nas bancadas do antigo estádio José Alvalade, e no seio da claque sportinguista Juventude Leonina, que pela primeira vez privou com skinheads, conforme o próprio assume em entrevista concedida ao jornal Correio da Manhã em Maio de 2005. Os primeiros anos da década de 90 ficam marcados pelos primeiros episódios de violência protagonizados pelas claques. Em Março de 1992, após o jogo entre Sporting e o F. C. do Porto a contar para a Taça de Portugal, os adeptos sportinguistas envolvem-se em confrontos com a polícia dentro e fora do estádio. Durante esta época de 1991-92, a exibição de bandeiras neo-nazis no seio das claques do Benfica, Sporting e F. C. do Porto são uma constante, mas é na época seguinte, 1992-93, que a situação se agrava, tendo a comunicação social dado grande atenção ao facto. Ainda em 1992, também em jogos a contar para a Taça de Portugal são exibidos símbolos de extrema-direita. Em Loulé, durante o Louletano – Benfica, membros dos Diabos Vermelhos exibem uma bandeira com a cruz suástica, e no Barreiro, no jogo Barreirense – Sporting, uma enorme faixa, contendo a palavra Skinheads e ladeada por uma cruz celta, é colocada na rede do estádio, precisamente na zona onde se encontravam as claques do Sporting. Mas não era só em estádios de clubes pequenos, onde o policiamento é mais fraco, que estes símbolos eram exibidos. Em pleno estádio da Luz, em Lisboa, no jogo que opôs o Benfica ao Dínamo de Moscovo, a contar para a Taça UEFA, a claque No Name Boys exibe uma faixa relativa às Waffen SS, a força de elite do exército nazi. A confirmação da infiltração da extrema-direita nas claques de futebol surge nas páginas da revista Sábado, onde é feita uma reportagem sobre o assunto, e onde membros da Juventude Leonina, incluindo o seu líder Fernando Mendes, posam para a foto fazendo a saudação nazi e segurando uma bandeira com a cruz celta. Mais tarde, em entrevista concedida ao jornal A Bola, o mesmo assume que o fez por uma questão de protagonismo, com o intuito de que a comunicação social desse alguma imagem da claque, e desvaloriza a saudação nazi, afirmando que fez o mesmo aquando do seu juramento de bandeira durante o serviço militar. Mas é no início do ano de 1993 que a opinião pública desperta em definitivo para esta situação. A 3 de Janeiro, durante o intervalo do jogo Belenenses – Benfica, membros afectos à claque No Name Boys provocam incidentes e agridem um funcionário do clube do Restelo, por este ter tentado impedir que os jovens benfiquistas vandalizassem o marcador do estádio, no seguimento dos incidentes é exibida uma bandeira com uma cruz suástica por um suposto membro dos já referidos Diabos Vermelhos, tudo isto captado pelas câmaras da televisão e visto por milhões de portugueses. Dias depois começam as reacções, a direcção do Benfica decide retirar o apoio às suas claques e o presidente do F. C. do Porto, Pinto da Costa, pede a demissão de Dias Loureiro, responsável pela pasta da Administração Interna do governo de Cavaco Silva, responsabilizando-o pelos últimos acontecimentos. A conexão entre este despertar da violência nos estádios de futebol portugueses e as infiltrações da extrema-direita começou a ser feita pela opinião pública, o que ainda perdura, sendo algo sempre reforçado por associações como o SOS Racismo.